por Arlindo Silva em 11 Nov 2009, 23:28
Que me perdoem aqueles que defendem uma maior intervenção do poder público na sociedade civil, e na economia, em detrimento da iniciativa privada. Aqueles que me conhecem, sabem que defendo denodadamente, que o poder público não deve intervir, senão como regulador, nas actividades, que quanto a mim, sejam pertença da iniciativa privada.
Acredito que só se conseguirá um equilíbrio justo e sustentável, segundo o princípio, UTILIZADOR PAGADOR!
Porém, o Aeródromo de Mogadouro foi construído com dinheiros públicos, e é disso que se trata agora, com um objectivo bem claro, exaustivamente difundido, e que talvez por essa razão, colheu a aprovação das entidades públicas para o investimento.
É sempre assim!
Os gestores dos dinheiros públicos, mais ou menos de boa fé, e mais ou menos pressionados sobre a influência de alguns lobbies, autorizam a aplicação dos dinheiros que lhes estão confiados.
Até aqui tudo bem, não fora o facto desses responsáveis, a partir daí, se divorciarem do projecto, e dos objectivos, para os quais foram projectados e construídos.
Sou piloto de avião, e de planador, como hobby, e empresário de profissão.
Na minha empresa, como em qualquer outra, o objectivo é o lucro. Como gerente cabe-me a responsabilidade de fazer com que tal aconteça. Se me divorciar destas responsabilidades, as consequências são
..a FALÊNCIA!
O Aeródromo de Mogadouro foi construído com o objectivo de promover os desportos aeronáuticos, em especial o voo à vela, e através destes atrair turismo à região.
Em cinco anos de actividade, este projecto, (que custou mais de 1.000.000 euros ao erário público) conseguiu fazer 5 novos pilotos, e como todos eles são residentes locais, (comem e dormem nas suas próprias casas) não trouxeram qualquer valor acrescentado ao turismo.
Mas, o esbanjamento dos bens públicos não acaba aqui, senão vejamos:
Investimento nas Infra-estruturas +/- 1.000.000 €
Despesas Anuais da Actividade
Ordenado do Director de Aeródromo +/- 34.000 €
Despesa de Gasolina +/- 5.000 €
Seguro, Manutenção, Amortiz. avião de reboque +/- 10.000 €
Seguro, Manutenção, Amortiz. Moto-planador +/- 8,000 €
Seguro Manutenção, Amortiz. 2 planadores +/- 6,000 €
Outras despesas +/- 16,000 €
TOTAL ANUAL +/- 80.000 €
============
Vejamos as receitas anuais:
5 Pilotos em cinco anos, ou seja, uma média de um piloto por ano: +/- 2.000 €
Outros voos efectuados por convidados do director +/- 3.000 €
Hangaragem de planadores privados +/- 360 €
TOTAL ANUAL 5.360 €
===========
RESUMO
Para além da despesa inicial do projecto, este elefante branco continua a custar ao erário público, no mínimo +/- 75.000 € por ano!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
BENEFICIADOS
Meia dúzia de nativos locais, e outra meia dúzia de convidados do Senhor Director de Aeródromo e seus correligionários.
Perante isto, somos indubitavelmente levados a pensar que o dinheiro dos nossos impostos está a ser indevidamente usado, ou está claramente a ser usado em benefício duma minoria, mas o problema é bem mais grave.
É sabido que o país gasta mais do que aquilo que produz, logo a receita é inferior à despesa, como consequência, o país está a endividar-se a passos galopantes, por isso este caciquismo que se verifica no Aeródromo de Mogadouro, está a produzir uma factura que os nossos filhos hão-de pagar.
Com diz o meu grande amigo, António Conde – mais que não fosse, este não é de certeza o futuro que queremos legar aos nossos filhos.
Mas, como eu referi atrás, aquando da construção do projecto Aeródromo do Mogadouro, acredito na boa fé do poder público, ao dar luz verde a um tal projecto, porque embora à data não houvesse mais de 60 praticantes de voo à vela em Portugal, esta é no entanto uma modalidade que acolhe grande número de praticantes em toda a Europa, a partir de tenra idade e senão vejamos:
Alemanha mais de 30.000 pilotos
França mais de 15.000 pilotos
Inglaterra mais de 15.000 pilotos
Calculo que na União Europeia há mais de 100.000 praticantes desta modalidade aeronáutica.
Em Julho deste ano, cinco dos pilotos, (entre eles eu) que tinham solicitado autorização para voar em Mogadouro, a quem essa autorização foi recusada, com base nos argumentos mais soezes, que só a mais torpe das mentes podia rebuscar, decidiram rumar a Fuentemillanos em Espanha.
Durante uma semana, voamos e convivemos com pilotos e suas famílias, alemães, belgas, franceses, holandeses, espanhóis e suíços. Alguns permaneciam duas semanas, e outros quatro e mais. Nós portugueses ficamos apenas uma semana, e entre reboques, alojamento e alimentação despendemos no total 5.000 €, e nenhum de nós levou as suas famílias. Fazendo de novo as contas de merceeiro, e calculando que os cerca de 50 pilotos que em média demandam diariamente a Fuentemillanos, nos quatro meses de época alta, contribuem com mais de 1.200.000 € para a economia local.
Em Portugal somos menos duma centena, apesar de termos tradição neste campo. No próximo dia 14 comemora-se os 100 anos do primeiro voo de planador em Portugal. Fomos seguramente um dos países pioneiros neste campo.
Porque somos afinal tão poucos em Portugal?
Não podemos acusar o poder público de não ter feito nada pela modalidade, como é tão frequente, porque temos o exemplo de Mogadouro, onde o poder público investiu o que tinha e o que não tinha.
Então, é dever cívico de cada cidadão deste país, denunciar e combater com todos os meios que o sistema nos disponibiliza, a falta de decência, de honestidade e de rectidão, da gestão de coisa pública.
Ultimamente, alguns dos convidados do Senhor Director de Aeródromo, vieram defender que sempre foram bem recebidos.
Dou-lhes razão!
Eu também faço parte dessa lista de privilegiados! Fui talvez o primeiro convidado do Senhor Director de Aeródromo a voar em Mogadouro. No próprio dia da inauguração e quando o felicitava pela obra realizada, convidou-me pessoalmente a voar sempre que quisesse em Mogadouro, mas sublinhando que o convite era individual. Era dia de festa, e por isso não era oportuno fazer estalar logo ali o verniz.
Mais tarde formulei-lhe o pedido para voar em Mogadouro, na qualidade de Presidente da Comissão Nacional do Voo à Vela, e a resposta foi, que os convites seriam individuais e endereçados por ele mesmo.
É isto que eu combato, que eu repugno e que me revolta. Se é coisa pública, recuso-me a fazer parte da lista de privilegiados, seja ela qual for. Se ali está o dinheiro de todos nós, tem que estar acessível a todos, aos actuais praticantes e aos vindouros, sem qualquer discriminação ou privilégio.